quinta-feira, dezembro 18, 2025

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O lucro como direito do pequeno produtor rural

A margem de lucro do pequeno produtor rural é tão incerta que qualquer imprevisto derruba a renda da família inteira.

Há certas verdades tão evidentes que o Brasil parece ter criado um talento especial para não as enxergar. Uma delas é a seguinte: o pequeno produtor rural tem direito ao lucro. Não ao lucro envergonhado, de quem pede desculpas por ter trabalhado. Não ao lucro predatório, de quem espreme o vizinho. Mas ao lucro honesto, o lucro limpo, aquele que nasce do suor, da tecnologia certa, de boas práticas e de um mínimo — veja bem, um mínimo — de justiça econômica.

Ao longo da vida, sentado em cozinhas de chão batido, em varandas de madeira e em salas de reuniões cheias de PowerPoint, eu vi de tudo: gente produzindo muito e ganhando quase nada; gente que desistiu porque não via saída; e gente que só prosperou quando conseguiu romper o cerco dos atravessadores, da burocracia e da velha mentalidade de que “pequeno é problema”.

Essa é a maior farsa histórica do campo brasileiro: produzir muito, lucrar pouco e agradecer por isso.

Quando o País depende de quem não tem margem.

A base da produção de alimentos está nas mãos de milhões de agricultores familiares. São eles que:

  • Mantêm florestas de pé,
  • Abastecem as cidades com comida fresca,
  • Sustentam o leite, o café, a horticultura,
  • Preservam sementes, solos e tradições,
  • Brilham quando o mercado exige qualidade e rastreabilidade.

Mas aí vem o paradoxo: justamente esses produtores — que carregam o país nas costas — vivem com uma margem de lucro tão incerta que qualquer imprevisto derruba a renda da família inteira.

E aí eu pergunto, com toda sinceridade:

Como é que se constrói sustentabilidade, sucessão familiar e competitividade num cenário desses?

Não constrói. Pelo menos não sem mudar a lógica do sistema.

O ponto que quase ninguém tem coragem de dizer.

O pequeno produtor rural não quer favor. Não quer esmola.

Não quer promessa.

Ele quer acesso ao lucro — e isso exige três pilares:

1.  Produtividade viável

Não adianta pedir padrão europeu com tecnologia dos anos 80. A produtividade do pequeno cresce quando ele tem:

  • insumos de qualidade,
    • manejo orientado,
    • assistência técnica que fala a língua dele,
    • e tecnologia na palma da mão — simples, prática, barata. Tecnologia não é luxo: é ferramenta de sobrevivência.

2.  Governança mínima

O produtor precisa saber quanto custa produzir um litro de leite, um quilo de café ou uma caixa de hortaliças.

Quando ele entende custos e margem, negocia melhor, investe melhor

e para de ser enganado por “facilidades” que no fim custam caro.

3.  Pluralidade de mercados

Nenhum produtor prospera vendendo para uma única porta. O jogo muda quando ele:

  • acessa compradores diferentes,
    • vende com qualidade reconhecida,
    • participa de modelos coletivos,
    • entra em cadeias que recompensam valor, não apenas volume.

É aí que o pequeno deixa de ser coadjuvante e vira empreendedor da base.

A espinha dorsal do lucro: crédito e tecnologia.

Se existe um instrumento capaz de destravar a vida do pequeno, é o crédito. Mas não esse crédito de vitrine, cheio de papelada e juros escondidos. Falo do crédito civilizado — simples, acessível, objetivo.

O produtor precisa de:

  • crédito que caiba no bolso,
    • garantias inteligentes,
    • análise rápida,
    • e liberdade (e conhecimento) para investir no que realmente aumenta sua margem.

Crédito bom vira tanque de resfriamento, vira adubação correta, vira irrigação ajustada, vira melhor preço. Crédito ruim vira dívida eterna.

E hoje, graças às tecnologias digitais, o campo finalmente começa a experimentar um novo ciclo:

  • crédito via celular,
    • microfinanças rurais,
  • carteiras digitais,
    • pagamento na colheita,
    • cooperativas digitais que avaliam o histórico do produtor ao invés da escritura que ele não tem.

É a revolução silenciosa. Demorada, mas real.

Quando o lucro chega, tudo muda.

Eu já vi muita transformação silenciosa no interior do Brasil. Famílias que multiplicaram renda, jovens que voltaram ao campo, comunidades que se organizaram para certificar produtos, cooperativas que geraram preço justo, cafeicultores que saltaram de mercado comum para microlote premiado, leiteiros que saíram do R$1,80 para o R$2,30 com tecnologia simples.

E cada vez que isso acontece, fica claro:

O lucro do pequeno produtor não é um privilégio — é o combustível do desenvolvimento local.

Sem lucro não há dignidade. Sem lucro não há futuro.

Sem lucro não há sucessão. Sem lucro não há agro.

Sem rodeios: é direito, e ponto final.

O pequeno produtor rural é, sim, empreendedor. E como todo empreendedor, tem direito ao lucro. Direito de prosperar. Direito de viver da própria terra, e não sobreviver dela. Direito de transformar o trabalho em dignidade.

O Brasil só se tornará a potência que imagina ser quando parar de tratar o pequeno produtor como estatística e começar a tratá-lo como

protagonista — com crédito justo, tecnologia acessível, governança simples e oportunidades de mercado que recompensem valor.

É uma questão econômica. É uma questão social.

É uma questão moral.

E, acima de tudo, é uma questão de justiça.

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