O agrônomo digitalmente analfabeto não é apenas ineficiente; ele é perigoso, porque legitima decisões que não compreende.
Há uma cena recorrente no imaginário nacional: o agrônomo de botas sujas, prancheta na mão, olhando o horizonte da lavoura como quem lê um livro antigo, escrito pela natureza em letras tortuosas. Essa imagem não é falsa — mas tornou-se perigosamente incompleta. O mundo mudou. O campo mudou. E o engenheiro agrônomo que insiste em operar apenas com categorias mentais do século XX corre o risco de se tornar uma relíquia funcional, respeitada, porém irrelevante.
O que está em jogo não é uma disputa entre tradição e tecnologia. Isso é uma falsa dicotomia, típica de mentes preguiçosas. O verdadeiro conflito é entre consciência e inércia. Entre quem compreende o espírito do tempo e quem se esconde atrás do conforto da rotina.
A agricultura entrou, sem pedir licença, na era dos dados. Sensores no solo, imagens de satélite, algoritmos preditivos, plataformas de gestão, inteligência artificial, automação, internet das coisas. Tudo isso já está no campo — e não como promessa futurista, mas como realidade operacional. A pergunta, portanto, não é se o engenheiro agrônomo deve lidar com tecnologias digitais. A pergunta correta é:se ele não lidar, quem lidará em seu lugar?
E a resposta é óbvia e desconfortável.
O dado não decide sozinho — mas pune quem o ignora!
Há um equívoco infantil circulando por aí: o de que a tecnologia substituirá o agrônomo. Nada poderia ser mais tolo. Dados não pensam. Algoritmos não têm juízo moral. Sistemas não compreendem contexto agronômico, social, climático e econômico ao mesmo tempo. Eles calculam. Quem decide continua sendo o ser humano.
O problema é que, no agronegócio moderno, decide melhor quem decide com dados.
Big Data não é uma moda para apresentações vazias. É a materialização de algo profundamente clássico: observação
sistemática da realidade. A diferença é que agora observamos milhões de variáveis simultaneamente. Solo, clima, sanidade vegetal, histórico produtivo, comportamento de máquinas, consumo de insumos. O engenheiro agrônomo que domina a leitura desses dados torna-se um orquestrador da complexidade. O que não domina vira refém de relatórios que não entende.
Inteligência Artificial: ferramenta, não oráculo
A inteligência artificial, quando bem compreendida, não é um substituto do raciocínio agronômico, mas sua amplificação. Modelos preditivos ajudam a antecipar pragas, doenças, estresses hídricos e nutricionais. Sistemas de recomendação auxiliam no manejo. Mas nenhum deles sabe por que determinada decisão é eticamente correta, economicamente viável ou socialmente aceitável.
Esse juízo continua sendo humano. E, no campo, continua sendo — ou deveria ser — do engenheiro agrônomo.
Aqui surge uma responsabilidade silenciosa: quem não entende IA não consegue questioná-la. Aceita recomendações como quem consulta um horóscopo tecnológico.
O agrônomo digitalmente analfabeto não é apenas ineficiente; ele é perigoso, porque legitima decisões que não compreende.
IoT, automação e o fim do achismo
A internet das coisas levou ao campo algo que sempre faltou: continuidade da observação. Sensores não dormem, não esquecem, não “acham”. Eles medem. E ao medir continuamente, desmontam o império do achismo — esse velho vício rural travestido de experiência.
Automação não elimina o agrônomo. Elimina o improviso irresponsável. E isso incomoda. Sempre incomodou.
O profissional que entende IoT, automação e integração de sistemas, passa a atuar como gestor de processos vivos, conectando solo, planta, máquina, clima e mercado. É um salto civilizacional dentro da profissão.
O engenheiro agrônomo como tradutor do futuro
Talvez o papel mais subestimado — e mais nobre — do engenheiro agrônomo na era digital seja o de tradutor. Tradutor entre tecnologia e produtor. Entre dado e decisão. Entre inovação e cultura.
O produtor rural não rejeita tecnologia por ignorância. Rejeita por desconfiança justificada. Já viu modismos demais, promessas vazias demais, soluções desenhadas em escritórios climatizados por quem nunca pisou num talhão. Cabe ao agrônomo, com autoridade técnica e moral, filtrar, adaptar, explicar e implementar.
Quando faz isso, ele não apenas aumenta produtividade. Ele constrói confiança. E confiança é o insumo mais escasso do agronegócio
moderno.
Engenheiro Agrônomo: ou protagonista, ou peça de museu
As tecnologias digitais não são uma camada opcional da agronomia contemporânea. Elas são sua nova infraestrutura intelectual. Ignorá-las é escolher a marginalidade profissional. Dominá-las é assumir o papel que sempre foi do engenheiro agrônomo: liderar a transição entre o que é e o que pode ser.
O futuro do agronegócio não será decidido por softwares, nem por máquinas, nem por algoritmos. Será decidido por pessoas capazes de usar essas ferramentas com inteligência, prudência e propósito.
E, gostemos ou não, esse peso recai sobre os ombros do engenheiro agrônomo.
A enxada ainda importa. Mas agora ela divide espaço com o algoritmo. E só sobreviverá quem souber usar ambos.
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