As cadeias produtivas de carne estão submetidas a uma rede cada vez mais densa de regulações e exigências globais.
O novo mapa da carne global: rastreabilidade, tecnologia e políticas em debate no WMC 2025
O World Meat Congress 2025 reuniu alguns dos principais nomes da cadeia global da carne em um debate que sintetiza o momento histórico do setor: como produzir mais proteína animal para alimentar o mundo — com sustentabilidade, rastreabilidade e equilíbrio entre custo, política e percepção pública.
Vale lembrar que o Congresso Mundial da Carne (WMC – World Meat Congress) foi realizado no Brasil pela primeira vez, consolidando o País como referência em produção sustentável de carne. Clique aqui e saiba mais sobre o evento!
Participaram da mesa Mariane Crespolini (Minerva Foods), Henrique (BRF), Rupert Claxton (Gira), Thanawat Tiesin (FAO), Alan Thompson (Beef + Lamb New Zealand) e Erin Borror (USMEF – U.S. Meat Export Federation).
O diálogo trouxe uma visão integrada de empresas, governos e organismos multilaterais sobre os desafios e oportunidades que moldam o futuro da carne global.
1. Um mercado que já não é livre — e nem igual
O consenso entre os participantes foi claro: não existe mais um mercado livre ou justo para a carne.
As cadeias produtivas de carne estão submetidas a uma rede cada vez mais densa de regulações e exigências globais — sobre clima, bem-estar animal, sanidade, desmatamento e emissões.
Além disso, a percepção dos desafios varia conforme o contexto socioeconômico de cada país.
Como resumiu Thanawat Tiesin (FAO), o debate global reflete o contraste entre “os estômagos cheios e os estômagos vazios”: enquanto países ricos discutem emissões e restrições ambientais, os países em desenvolvimento ainda lutam para garantir segurança alimentar e renda rural.
2. Rastreabilidade como eixo central — o caso Minerva Foods
Para Mariane Crespolini (Minerva Foods), a rastreabilidade desde o nascimento do animal é o maior desafio — e, ao mesmo tempo, a maior oportunidade — da pecuária mundial.
A Minerva monitora 100% dos fornecedores diretos em Brasil, Uruguai, Paraguai, Colômbia e Argentina, garantindo conformidade ambiental, trabalhista e fundiária em mais de 65 mil fazendas.
O desafio está na rastreabilidade indireta, em sistemas com múltiplas fases produtivas, especialmente no Brasil e Paraguai.
O Uruguai, com 100% do rebanho rastreado individualmente, é o modelo a ser seguido.
Mariane defendeu o avanço do Programa Nacional de Rastreabilidade Individual de Bovinos (CNIB) e destacou o pioneirismo da Minerva na exportação de couro totalmente rastreado e em incentivos econômicos a produtores que cumprem protocolos ambientais.
“A rastreabilidade é a nova credencial de acesso aos mercados globais. Sem ela, não há competitividade”, afirmou Crespolini.
3. Sustentabilidade como passaporte comercial — o caso BRF
Henrique (BRF) apresentou o papel da nova gigante NBRF, fusão entre BRF e Marfrig, hoje uma das maiores companhias globais de proteína animal, com faturamento de US$13 bilhões e operações na América do Sul e Austrália.
A BRF já alcançou 100% de rastreabilidade na compra de grãos, com política de desmatamento zero, enquanto a Marfrig deve se tornar, até o fim do ano, a primeira empresa da América do Sul com 100% de gado proveniente de áreas livres de desmatamento — direta e indiretamente.
“A sustentabilidade deixou de ser diferencial e se tornou requisito de acesso. Em muitos casos, é mais determinante que o preço”, ressaltou Henrique.
A NBRF também vem ampliando o uso de tecnologia de satélites para monitoramento ambiental e classificação eletrônica de carcaças, personalizando cortes segundo o perfil de consumo de cada mercado.
Henrique reforçou o potencial produtivo do Brasil e convidou empresas europeias a investirem no país, destacando o equilíbrio entre escala, sustentabilidade e produtividade como diferencial competitivo global.
4. Quando políticas ambientais saem do controle — o alerta da Nova Zelândia
Alan Thompson (Beef + Lamb New Zealand) trouxe um importante contraponto ao debate regulatório.
Ele relatou os efeitos perversos do esquema de comércio de emissões adotado pelo governo neozelandês, que incentivou a conversão de 300 mil hectares agrícolas em florestas de sequestro de carbono.
O resultado foi uma redução na produção primária, aumento de riscos ambientais e dependência crescente de importações alimentares.
Como resposta, a organização investe em dados de campo coletados há mais de 75 anos e no uso de tecnologias de manejo virtual, que permitem cercamento digital, aumentam a produção de capim em até 30% e reduzem emissões.
“Precisamos de políticas ancoradas em ciência, não em ideologia”, reforçou Thompson.
5. Políticas e o ruído social — a visão da FAO
Thanawat Tiesin (FAO) defendeu um equilíbrio entre ciência, política e percepção pública.
Segundo ele, as decisões sobre o futuro da pecuária não podem ser reféns de pressões unilaterais, mas precisam envolver produtores, governos, setor privado, consumidores e ativistas em um diálogo construtivo.
Ele alertou que reduzir a produção de proteína animal sem considerar o impacto nutricional e social pode gerar desequilíbrios graves em regiões vulneráveis.
Tiesin reafirmou o compromisso da FAO com os “Quatro Melhores” — Melhor Produção, Melhor Nutrição, Melhor Ambiente e Melhor Vida — e enfatizou que o papel da instituição é construir pontes e criar uma narrativa positiva baseada em evidências.
6. O papel dos dados e da colaboração — reflexões da Gira e da USMEF
Rupert Claxton (Gira) ressaltou que a indústria global precisa superar a falta de confiança e coesão.
Produtores hesitam em investir em novas estruturas por não acreditarem na rentabilidade de médio prazo.
A solução, segundo ele, está na cooperação internacional, compartilhamento de dados e valorização da produtividade baseada em ciência e transparência.
Já Erin Borror (USMEF) abordou o impacto das novas tecnologias, como a edição genética (CRISPR), e a necessidade de harmonização regulatória global para evitar barreiras comerciais, especialmente entre EUA e Europa.
Borror também destacou o avanço sanitário do Brasil, recentemente reconhecido pela OIE como país livre de febre aftosa sem vacinação — um passo histórico que abre portas para mercados de alto valor, como Japão e Coreia do Sul, e reforça a imagem do Brasil como fornecedor confiável de carne premium.
Conclusão — a carne do futuro será rastreável, tecnológica e colaborativa
O debate mostrou que a carne do futuro será definida não apenas pela capacidade de produção, mas pela qualidade da governança, dos dados e da comunicação.
A rastreabilidade e a transparência tornam-se o novo padrão global, e o Brasil se posiciona no centro desse movimento, combinando escala produtiva e compromisso ambiental.
Em um mundo dividido entre “estômagos cheios” e “estômagos vazios”, o desafio será equilibrar eficiência, sustentabilidade e acesso.
O caminho está claro: produzir mais, com responsabilidade — e contar essa história ao mundo.
Confira também os destaques da palestra de Rupert Claxton, no Congresso Mundial da Carne, que analisou o futuro da carne, ressaltando a crescente demanda mundial e os desafios de atender esse maior consumo! Clique aqui!
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