Em 2025 começamos a enxergar melhor os desafios e as consequências cada vez maiores das disputas geopolíticas globais e em 2026, o que esperar?
Tendências e desafios e a nova geopolítica do agro. O próximo ciclo não aquele para “tocar do mesmo jeito”. Com clima mais volátil, crédito mais seletivo, regras internacionais mais duras e cadeias mais politizadas, o produtor que vai precisar transformar gestão em estratégia: reduzindo risco, provando conformidade, protegendo caixa e ganhando poder de negociação.
2025 não foi “só” um ano de safra. Foi o ano em que o mundo escancarou, na prática, uma regra antiga com roupa nova: quem produz alimentos em escala, controla energia e domina insumos estratégicos, inclusive terras raras, carrega poder. E aqui vai a primeira chave de leitura: geopolítica não é linear, ela avança em ondas, recua em crises e muda de direção com uma eleição, um conflito, um choque de oferta ou uma seca. Em um cenário de conflitos persistentes, protecionismo velado, cadeias logísticas tensionadas e clima cada vez mais imprevisível, a segurança alimentar saiu do campo do discurso e virou assunto de estabilidade social e de segurança nacional.
Nesse tabuleiro, o Brasil ocupou posição central por um motivo objetivo, entrega escala, regularidade e competitividade. E, justamente por isso, passou a ser mais cobrado, mais vigiado e mais pressionado por regras e narrativas que frequentemente ignoram a realidade tropical e a própria matemática da produção global.
Neste artigo, quero trazer para você leitor, uma retrospectiva de 2025, com seus ganhos e feridas, mas, principalmente, um mapa de tendências e desafios para 2026 sob lente geopolítica. E é assim que precisamos enxergar o agro para construir estratégia, entendendo o tabuleiro, antecipando movimentos e protegendo nossa competitividade.
2025, o mundo mais “político”, onde comércio virou arma e regra virou barreira.
A globalização não acabou, ela mudou de forma. Ficou mais seletiva e mais politizada. Cadeias foram redesenhadas sob lógica de “risco-país”, “risco regulatório” e “risco reputacional”. Em termos práticos, quem perde competitividade no custo e na produtividade tenta ganhar vantagem pela regra.
Foi nesse ambiente que exigências de rastreabilidade e due diligence passaram, em parte do mundo, a operar também como proteção comercial sofisticada. Não é teoria, é sobrevivência política de quem está com o campo pressionado internamente e precisa “nivelar o jogo” por fora.
O que manteve o Brasil respirando em 2025 e o que ficou só no anúncio.
Mesmo sob pressão, o agro brasileiro foi a âncora do Brasil real, manteve produção, exportação, empregos e divisas. Só que 2025 também deixou um ponto incômodo, o setor sustentou o sistema sem receber estabilidade institucional e financeira equivalente ao tamanho da responsabilidade.
Safra 2024/25 (força produtiva real, com margem apertada): a Conab estimou a safra de grãos 2024/25 em 345,2 milhões de toneladas, projetando recorde, com destaques para milho e soja. Só que volume não garante renda, oferta recorde pode conviver com aperto de margem quando crédito fica caro, logística encarece e o risco regulatório aumenta, e foi exatamente essa a sensação dominante no campo.
Produtividade (o ativo estratégico real do Brasil): séries do USDA/FAS colocam a produtividade média de soja do Brasil em 3,62 t/ha em 2024/25, enquanto nos EUA o USDA/NASS reportou 50,7 bushels/acre em 2024 (≈ 3,41 t/ha). Na geopolítica agrícola, produtividade não é só técnica, é poder de mercado, resiliência e capacidade de defender participação global quando o mundo entra em choque de oferta.
Expansão comercial (porta aberta, venda não garantida): o governo anunciou a abertura de 500 “novos mercados” em mais de 80 países, com potencial estimado de US$ 37,5 bilhões/ano. Relevante? Sim, como diplomacia e liberação sanitária. Mas, para o produtor, a tradução é simples: abrir mercado não é vender. Muitas vezes é liberação regulatória; para virar embarque, depende de habilitação de plantas, exigências do importador, certificações e logística.
Plano Safra recorde (no papel) e caro (na porteira): o Plano Safra 2025/26 foi lançado com R$ 516,2 bilhões para a agricultura empresarial. Mas 2025 expôs o óbvio, número não resolve o essencial, o acesso e custo. As taxas chegaram a 10% a.a. (Pronamp) e 14% a.a. (demais produtores) em linhas relevantes, comprimindo a viabilidade para quem opera na margem e favorecendo quem já tem escala e garantias. O retrato honesto do ano foi, recorde anunciado, alcance desigual.
Carne bovina (o fato incontestável e o ponto que exige precisão): o Brasil segue como maior exportador mundial de carne bovina, e isso, sozinho, já é geopolítica.
Mas é importante separar exportação de produção, pois relatórios de referência (USDA/FAS e Abiec) ainda colocam o Brasil como segundo maior produtor (com produção recorde em 2024) e líder em exportações. Há manchetes e projeções de mercado sugerindo ultrapassagem na produção em 2025, mas eu recomendo tratar isso como tendência em disputa, não como fato fechado, porque a credibilidade do texto depende dessa precisão.
O que travou em 2025, quando o risco não veio da lavoura.
Em 2025, parte relevante do risco do produtor não veio da chuva. Veio do ambiente institucional, do custo do capital e do conflito regulatório, além do choque geopolítico no comércio.
Tarifaço dos EUA (Trump): em julho, foi formalizado um pacote de tarifas chegando a 50% sobre importações do Brasil, com exclusões para setores estratégicos e início de vigência em agosto. Isso elevou incerteza, pressionou cadeias exportadoras e obrigou o Brasil a reagir com medidas de mitigação.
Insegurança jurídica no campo: CARs pendentes, sobreposições, judicialização e imprevisibilidade regulatória seguiram travando crédito, seguro e investimentos corroendo o valor do ativo-terra.
Conflito fundiário e invasões ilegais: episódios de invasões/ocupações e danos patrimoniais aumentaram risco operacional, encareceram seguro e ampliaram a sensação de instabilidade, um custo silencioso que o mercado precifica duro.
Pressão e conflito territorial no Norte (IBAMA/ ICMBio/ Funai): fiscalização e disputas em áreas sensíveis ocorreram em ambiente de alta tensão e baixa coordenação, ampliando incerteza para quem opera dentro da legalidade e precisa de regra clara para regularização e uso do território.
Marco temporal e insegurança fundiária: idas e vindas mantiveram o “risco de contestação” em regiões estratégicas, afetando investimento de longo prazo.
Irresponsabilidade fiscal e custo do capital: a deterioração de expectativas fiscais da gestão do governo, elevou custo do crédito e restringiu capital de giro, exatamente quando o agro precisa de previsibilidade e proteção climática.
Escalada de RJs na cadeia: aumento de recuperações judiciais elevou risco de contraparte, piorou confiança comercial e aumentou custo de transação.
Clima extremo virou risco sistêmico: eventos climáticos extremos consolidaram o clima como variável central de custo, produtividade e logística, e isso retroalimenta inflação de alimentos e protecionismo.
EUA × UE × China × Brasil: quem joga como potência e quem joga pelas regras!
No agro, não basta produzir, é preciso entender quem dita o jogo. 2025 deixou claro que há dois tipos de atores. Os que jogam como potências (blindando renda e mercado com dinheiro, estoque, tecnologia e política comercial) e os que jogam pelas regras (exportando exigências e custo para proteger competitividade). É nesse contraste que se decide quem captura valor, quem assume risco e quem paga a conta.
EUA (blindagem financeira): pagamentos diretos de programas agrícolas foram projetados em US$ 40,5 bilhões em 2025 (fora seguro e outros instrumentos). Isso é proteção estrutural: reduz risco, sustenta renda e mantém capacidade produtiva.
UE (apoio interno + “poder regulatório”): a Política Agrícola Comum (CAP) 2021–2027 soma €387 bilhões, com €291,1 bilhões no EAGF e €95,5 bilhões no EAFRD. Com esse nível de apoio e, ainda assim, pressão por competitividade, o bloco recorre com frequência a exigências e mecanismos de controle que deslocam custo para cadeias de fora.
China (segurança alimentar acima de narrativa): a China opera com pragmatismo, diversifica fornecedores, reforça estoques e infraestrutura e compra previsibilidade. Para ela, sustentabilidade é continuidade de abastecimento e ponto.
Brasil (potência produtiva com subdefesa estratégica): produz em escala, preserva em escala rara e, ainda assim, entra no jogo muitas vezes de forma reativa. Resultado: paga custo regulatório, reputacional e logístico sem capturar plenamente o prêmio de ser fornecedor indispensável.
O dado que desmontou narrativas globais, o Brasil preserva em escala continental.
Aqui está a munição técnica que o Brasil precisa usar com inteligência. A Embrapa mostra que o conjunto de áreas destinadas à vegetação nativa chega a 564 milhões de hectares, 66,3% do território nacional. Isso deveria ser tratado como ativo geopolítico e vantagem competitiva e não como arma narrativa contra o próprio país. É o coração do que eu chamo de Economia Verde Positiva: transformar virtudes verdes em defesa de mercado e valor por hectare.
2026: tendências e desafios e a nova geopolítica do agro.
Se 2025 foi o ano do teste, 2026 tende a ser o ano da consolidação de três movimentos:
Segurança alimentar vira política de poder: países vão priorizar produção doméstica, estoques e fornecedores “confiáveis”. Para o Brasil, mais demanda e mais pressão ao mesmo tempo.
Cadeias mais curtas e mais politizadas: empresas e governos redesenham cadeias para reduzir exposição a risco geopolítico e regulatório. Quem não tiver documentação mínima e rastreabilidade operacional perde prêmio ou perde mercado.
Economia Verde Positiva como vantagem competitiva real: em 2026, Economia Verde Positiva vale quando entrega resultado: produtividade por hectare, gestão de risco climático e de insumos, segurança jurídica e documental, valorização de ativos com lastro e inovação no território.
Oportunidade 2026: choque tributário + recuperação de impostos = mecanismo de reversão para seguro rural
Produtor, atenção nessa mensagem! O ano de 2026 adicionará um componente silencioso, mas decisivo, a transição da reforma do consumo, com orientação para emissão de documentos fiscais eletrônicos com destaque de CBS e IBS em “ano de teste”, elevando custo de conformidade e risco operacional.
E é aqui que surge uma janela alinhada à Economia Verde Positiva: transformar eficiência tributária em proteção climática. A recuperação de impostos pode virar um mecanismo de reversão, um fundo/conta carimbada para resiliência, destinado a pagar prêmio, franquia ou complementar cobertura do seguro rural, reforçando continuidade produtiva quando o clima falha.
2026: a lição de casa do produtor no novo tabuleiro global.
O próximo ciclo não será um ano para “tocar do mesmo jeito”. Com clima mais volátil, crédito mais seletivo, regras internacionais mais duras e cadeias mais politizadas, o produtor que vai atravessar bem o ciclo é aquele que transforma gestão em estratégia: reduzindo risco, provando conformidade, protegendo caixa e ganhando poder de negociação.
Algumas recomendações:
- Gestão de risco no centro do negócio: clima, preço, crédito, logística e regulação viram painel de comando.
- Documentação e governança da fazenda: contrato, mapa, cadastro, histórico e evidências em 2026, quem prova, vence.
- Seleção dura de projetos e promessas: sem segurança jurídica, metodologia robusta e mercado claro, o risco costuma superar o retorno.
- Coalizões fortes: cooperativas, associações e alianças regionais para escala política e poder de negociação.
- Entender a geopolítica do agro: preço não nasce só na lavoura, nasce em Washington, Bruxelas e Pequim.
- Avaliar reversão via recuperação de impostos: para reforçar seguro rural e resiliência financeira com regra e auditoria.
2025 mostrou que o Brasil alimenta o mundo e 2026 exigirá que o Brasil aprenda a se defender.
O agro brasileiro não é problema global, ele é parte da solução estrutural do século XXI. Mas em um mundo em que regras viraram armas e cadeias viraram tabuleiros, produzir bem já não basta. O desafio de 2026 é transformar nossa força produtiva em defesa estratégica e colocar a Economia Verde Positiva como rota de competitividade real, com ciência, gestão e valor. Porque quem alimenta o mundo precisa, finalmente, ocupar o lugar de poder que já conquistou na prática.
E mudando de assunto, a crescente presença da China no agronegócio brasileiro vai muito além do comércio de commodities. Sem gerar endividamento soberano direto, o país asiático vem construindo uma estratégia de condicionamento econômico baseada em mercado, crédito, logística e contratos de longo prazo. Esse modelo, conhecido como “diplomacia do endividamento”, não provoca rupturas imediatas, mas reduz gradualmente a margem de decisão do agro, especialmente em um cenário global marcado por disputas de poder e uso crescente da economia como instrumento de influência. Clique aqui e saiba mais!
E por falar no endividamento chinês no agronegócio brasileira, veja também que a compra de terras agrícolas no Brasil pela China vem acontecendo de modo silencioso e já acende sinal de alerta entre produtores, juristas e especialistas em soberania territorial. Clique aqui e saiba mais!
Renato Seraphim destaca também para o fato de não existir crise no agronegócio, mas sim um ajuste cíclico que expõe as vulnerabilidades do setor diante de gargalo logístico, volatilidade e necessidade de agregar valor do produto! Clique aqui e saiba mais!
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